Paixões & Legados
Escrita por Fafá
Faixa das 18h
Leonel acorda. Ele abre os olhos aos poucos tentando entender o que está acontecendo. O rapaz olha ao seu redor, se encontra num quarto simpático, mas também luxuoso, com paredes e móveis de cor clara e sente um grande conforto na cama em que está deitado. Ao seu lado, sentada em uma poltrona lendo um livro, está uma jovem moça, Celine, a qual ele nunca viu na vida.
LEONEL (Confuso): Onde estou?
CELINE: Fico feliz que tenha acordado. Meu nome é Celine e esta é minha casa. Encontrei-o abandonado na beira de uma estrada de chão.
LEONEL: Lembro-me vagamente de ter chegado lá. Por que me ajudou?
CELINE: Ora, não poderia deixar uma pessoa baleada abandonada na beira da mata. Senti que deveria lhe ajudar, tive pena de sua situação.
LEONEL: Agradeço!
CELINE: Agora me conte: como chegou nesse estado?
LEONEL: É uma longa história.
CELINE: Eu tenho tempo.
Lúcia arruma as mesas da pensão com o pensamento distante.
TOMÉ: O que há, Lúcia? Está com a cabeça em outro mundo, mal pisca os olhos.
LÚCIA: Estava pensando em algo que aconteceu hoje mais cedo. Fui convidada para um jantar.
TOMÉ: Olha só… Uma moça bonita como você não demoraria tanto para receber galanteios. Quem é o corajoso que lhe convidou?
LÚCIA: É um homem que conheci hoje na mercearia, o nome é Bernardino.
Tomé se espanta com o nome.
TOMÉ: Bernardino? O senhor Bernardino? O homem mais rico desta cidade?
LÚCIA: Ele mesmo. Sabe, fiquei o dia inteiro pensando se deveria ir ou não. Ele foi tão gentil comigo, parece-me simpático.
TOMÉ: Está esperando o que pra se arrumar? Não pense mais nenhuma vez e vá nesse jantar. Eu estou te liberando nesse exato momento.
LÚCIA: Acha mesmo que deveria ir?
TOMÉ: Sem dúvidas! Agora vá botar uma roupa bonita e não demore para não deixar o anfitrião esperando.
Lúcia vai pulando de alegria até seu quarto.
CELINE: É uma baita história… Sinto muito que tenha passado por tudo isso.
LEONEL: Mesmo que tenha passado pouco tempo, foi uma situação muito difícil. Enquanto eu corria mata adentro no meio da noite, só conseguia pensar que morreria. Tive medo de nunca conseguir redimir meus erros.
CELINE: Mas agora está vivo, e tem a chance de recomeçar. O que me surpreende é a tamanha coincidência de que eu estava saindo da fazenda do Coronel Guilhermino, o lugar onde você estava preso, quando te encontrei na beira daquela estrada.
LEONEL: A senhorita conhece o Coronel?
CELINE: Sim, eu também tenho terras naquela região. Fui resolver um problema que ele está causando, plantando em minhas terras sem permissão.
LEONEL: Esse sujeito é terrível mesmo. Meu maior desejo é destruí-lo assim que me reerguer.
É ouvido um barulho vindo da sala.
CELINE: Minha irmã, Débora, deve ter chegado. Me perdoe pelo meu pedido, mas se importa de ficar por um tempo em silêncio? Apenas até a hora de minha irmã dormir. O Doutor Gustavo pediu que tivesse descanso e se Débora vier aqui, tenho certeza de que só vai piorar a situação.
LEONEL: Tranquilo! Mas não vai contar a ela que estou aqui?
CELINE: Não hoje. Ela enlouqueceria se soubesse que trouxe um desconhecido para dentro de casa.
Eles ouvem Débora gritar pelo nome de Celine.
CELINE: Bom descanso! Vou pedir para Ziraldo, meu mordomo, ficar aqui perto do quarto para caso precise de alguma.
Celine sorri para ele e sai do quarto. Ao chegar na sala, ela encontra com Débora.
DÉBORA: Onde você estava, hein? Estou há meia hora aqui, te chamando.
CELINE: Estava no jardim.
DÉBORA: Nesse escuro?
CELINE: O que foi, Débora? Vai ficar me interrogando agora? Ficou o dia inteiro fora e eu não perguntei nada sobre seu paradeiro.
DÉBORA: Hum. Vamos jantar?
CELINA: Peça que sirvam junto com meu chá.
Bernardino está sentado diante de sua enorme mesa de jantar. Mercedes se aproxima do patrão.
MERCEDES: Pediu que eu colocasse dois pratos, está esperando alguém?
BERNARDINO: Tenho uma convidada, mas não sei se ela vem.
MERCEDES: Ora, convidou uma pessoa capaz de fazer tal desfeita?
BERNARDINO: Tenho certeza de que ela virá.
Instantes após, a campainha toca.
BERNARDINO: Abra, Mercedes. Vou ficar esperando em minha bibliotece.
Mercedes se dirige até a porta e a abre, revelando ser Lúcia a pessoa aguardando. A governanta faz uma referência para que a moça entre. Lúcia, olhando ao seu redor, fica indignada e deslumbrada com o luxo do local.
MERCEDES: O senhor Bernardino te espera na biblioteca dele, siga-me.
As duas seguem o caminho até o cômodo. Lúcia continua olhando maravilhada para todos os detalhes. Elas chegam na biblioteca.
BERNARDINO: Querida Lúcia! Seja bem-vinda!
LÚCIA: Obrigada, Seu Bernardino! Estou sem palavras para a beleza de sua residência.
Lúcia olha abismada para as enormes estantes de livros.
BERNARDINO: Fico feliz que tenha vindo. Tive receio que recusasse meu convite, mas felizmente terei companhia para o jantar de hoje.
LÚCIA: Eu que tenho a agradecer. Queria entender o porquê do senhor ser tão generoso comigo, mal me conhece.
BERNARDINO: Quando te vi na mercearia e tivemos aquele momento de conversa, enxerguei em você uma pessoa bondosa, humilde, graciosa, uma beleza encantadora. Tu me deste atenção, mesmo que por um breve momento, me deu a honra de sua companhia. Já lhe disse que sou um velho homem solitário, grande parte de meus amigos já vieram a falecer e não conheço muitas pessoas. Percebi que a senhorita poderia ser a amiga de que preciso, alguém com quem eu possa conversar sobre meus pensamentos e sentimentos, alguém que… me fizesse bem.
Lúcia se encanta com as palavras de Bernardino.
LÚCIA: Eu concordo com o senhor, e vejo que poderemos ser grandes amigos. Também não conheço muitas pessoas, minha vida virou de cabeça para baixo recentemente e vim para esta cidade recomeçar. Fico feliz que o senhor tenha gostado de mim logo de cara.
BERNARDINO: Peço que abandone esse modo como me chama, “senhor”, me chame de “você”, até porque concordamos que somos amigos.
Bernardino olha ao seu redor.
BERNARDINO: Gosta de livros? Podemos esticar o assunto antes do jantar.
Guilhermino está sentado em sua cadeira de balanço na varanda do casarão, observando a escuridão da noite. Jarbas se aproxima do patrão.
GUILHERMINO: E então? Achou o sujeito?
JARBAS: Procurei por vários pontos da cidade e nada. Tentei seguir algum rastro dele na mata também, mas não consegui chegar em lugar nenhum.
GUILHERMINO: E o que fará agora?
JARBAS: Os amiguinhos dele me deixaram uma pista da vida do rapaz antes dele chegar até aqui. Talvez eu consiga alguma coisa…
GUILHERMINO: Pois então, não perca tempo. Saia amanhã bem cedo para começar a busca.
JARBAS: Sim, senhor!
Bernardino e Lúcia estão sentados à mesa, jantando.
BERNARDINO: Então você trabalha na pensão Maria das Graças. Interessante, eu ajudei na fundação dela há uns anos atrás, é um negócio que está dando muito.
LÚCIA: Sim, Seu Tomé é um homem muito generoso. Inclusive, se não fosse por ele, eu ainda estaria em dúvida se deveria vir ou não.
BERNARDINO: Vejo então que o Seu Tomé é um homem muito inteligente. Você disse que sua vida virou de cabeça para baixo recentemente, o que aconteceu?
LÚCIA: Foram algumas situações…
BERNARDINO: Vejo que não está preparada para contar ainda. Tudo bem, eu entendo, mas saiba que estou aqui para que você possa desabafar.
LÚCIA: Não… eu… eu não contei a ninguém ainda sobre o que aconteceu, e nem mesmo às pessoas que me ajudaram. Guardar esse segredo, sem desabafar com ninguém, está me matando por dentro. Peço desculpas por te encher com minhas preocupações…
BERNARDINO (Interrompendo): Não, por favor, sinta-se à vontade para compartilhar comigo.
Lúcia começa a contar sua história.
Débora e Celine também estão jantando, só que num silêncio ensurdecedor. Celine come sua comida com a cabeça em outro mundo, enquanto Débora observa a irmã.
DÉBORA: O que está acontecendo? Você está estranha demais.
CELINE: Você que está paranóica.
DÉBORA: Não! Primeiro você me aparece no jardim de noite, coisa que não costuma fazer. E desde de então, está com os pensamentos distantes, distraída. O que está te deixando assim?
CELINE: Já disse que não há nada. Agora, licença, pois vou me deitar.
DÉBORA: Nem terminou de comer.
Celine apenas sai sem dizer mais nenhuma palavra.
BERNARDINO: Ele só te abandonou assim? Sem mais e nem menos.
LÚCIA: Sim, quando isso aconteceu, fiquei completamente perdida sem saber o que fazer.
BERNARDINO: Sinto muito pelo o que tenha passado. Esse homem não tinha o direito de te abandonar, vocês viveram uma história juntos, pegos no flagra cometendo adultério. Acho errado ele ter destruído sua reputação e depois ter te abandonado.
LÚCIA: As minhas escolhas não foram certeiras também.
BERNARDINO: Bom, mas agora você está aqui, e pode apagar tudo isso que viveu, esquecer disso tudo, nada mais te prende ao passado.
LÚCIA: Na verdade, há uma parte que eu não contei.
BERNARDINO: O que é?
LÚCIA: Estou grávida. Estou esperando um filho de Leonel.
Bernardino se choca com a revelação.
BERNARDINO: Grávida? Lúcia, isso é muito grave.
LÚCIA: Eu sei. Queria apenas recomeçar minha vida, mas se descobrirem que estou grávida e solteira, minha reputação está acabada de novo.
BERNARDINO: Eu posso te ajudar com isso…
LÚCIA: Como?
BERNARDINO: Eu posso dar um nome ao seu filho. Case-se comigo, é um pedido que tenho a lhe oferecer.
ENCERRAMENTO
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