Anabel se levanta da cama e fica frente a frente com Valentim.
ANABEL: Casar? Tão de repente? Não seria certo…
VALENTIM: E por que não? Anabel, nós somos livres. Eu amo você, e esse é o meu maior desejo atualmente.
ANABEL: Está se precipitando. Eu achava que você era meu irmão até algumas horas atrás. Não é tão fácil para mim esquecer tudo isso e seguir em frente como se nada tivesse acontecido.
VALENTIM: Eu vou deixar você pensando por um tempo, mas pense bem. Nós podemos dizer a todos que o engano foi meu, que eu não sou filho legítimo de Bernardino, assim tudo corre normalmente para você.
ANABEL: Agradeço por ser tão gentil comigo, mas me deixe sozinha agora. Eu só preciso de um tempo sozinha com meus pensamentos.
VALENTIM: Está bem. Estarei aguardando uma resposta.
Valentim se retira do quarto. Anabel se joga na cama e põe a mão no rosto, em sinal de desespero.
Mercedes arruma a mesa do jantar e apenas Valentim aparece.
MERCEDES: Está tudo bem com a senhorita Anabel? Vi que ela chegou abatida, inconsolável. Sabe o que aconteceu?
VALENTIM: Ela precisa de um tempo para si. Descobriu que não é filha de meu pai.
Mercedes se assusta com o que o rapaz fala.
MERCEDES: Como?
VALENTIM: É isso mesmo que ouviu. Agora eu entendo o porquê daquelas suas insinuações e provocações, você sempre soube disso, não é? É, e sempre foi, os olhos e ouvidos desta casa, claro que sabia disso, e por isso disse aquelas coisas.
MERCEDES: Não era para ela ter descoberto esse fato. Sempre escondi esse segredo com bastante empenho, para vir à tona assim?
VALENTIM: Eu não entendo o que isso muda para você. Por que sempre escondeu isso? Quais são suas intenções, afinal?
MERCEDES: Chega desse interrogatório! Vou oferecer um chá para a senhorita Anabel. Quanto a você, rapaz, pare de agir desta forma. Mesmo você sendo o único filho de Bernardino, Anabel ainda é a herdeira. Ele sabia que ela não era filha dele, e mesmo assim pôs o seu nome no testamento. Então, atenha-se!
Mercedes se vira e sai do local.
Um novo dia amanhece. Anabel acorda mais disposta, ainda de cabeça avoada um pouco. Ela caminha vagarosamente até a sua biblioteca, com a cabeça cheia de pensamentos. Ela chega na sala, onde Valentim lê um livro. O rapaz põe a obra em cima da mesinha de canto e anda até a moça.
VALENTIM: Bom dia! Dormiu bem?
ANABEL: Na verdade, quase não dormi durante essa noite.
VALENTIM: Se quiser que eu me retire para se sentir mais à vontade…
ANABEL: Eu vim até aqui atrás de você. Tomei uma decisão, eu aceito a sua proposta. A verdade é que eu estava muito confusa com o que eu sentia, sempre tive um sentimento estranho por você, mas agora eu sei que quero viver ao seu lado. Demorei para me render a esse sentimento, mas não dá mais para esconder, eu também gosto de você!
Ela se joga aos braços do rapaz, seus rostos se aproximam, e eles selam um longo beijo. Eles se afastam.
VALENTIM: Não sabe o quanto eu esperei por esse momento…
Eles voltam a se beijar.
Jarbas vai até o casarão, olhando para os lados e certificando de que ninguém está o seguindo. Porém ele não vê Vitório escondido entre as árvores. O capataz entra no casarão.
JARBAS: Mandou me chamar, Coronel?
GUILHERMINO: Venha até aqui!
O homem se aproxima e o Coronel cochicha em seu ouvido.
GUILHERMINO (Cochichando): Há alguém ouvindo nossas conversas. Vou lhe falar algumas coisas, mas não leve a sério.
Eles se afastam. Enquanto isso, Vitório entra vagarosamente no casarão, ouvindo a conversa pelos cantos. O Coronel aumenta seu tom de voz.
GUILHERMINO: Nosso último plano deu errado, mas temos que seguir em frente. Vamos matar Leonel, nesta tarde. Fique esperando ele sair pela porta da fábrica, e atire contra o sujeito.
JARBAS: Claro, Coronel!
Vitório se esconde num quarto com a porta aberta. Jarbas se retira do local, olhando para os lados novamente.
A campainha da Mansão Ferreira toca. Mercedes atende a porta, recebendo Lino.
LINO: Anabel está?
MERCEDES: No momento, não.
LINO: Sabe se ela demora?
MERCEDES: Não sei, ela não me disse nada.
LINO: Eu a esperarei aqui.
Valentim desce as escadas, para ver quem chegou.
VALENTIM: Lino, que prazer em vê-lo! Como está?
LINO: Bem. Sabe por que Anabel saiu correndo da pensão ontem? Estava aos prantos, nem se despediu do pessoal de lá.
VALENTIM: Entenda que ela está num momento difícil. Ela acaba de descobrir que não é filha de meu pai.
LINO (Confuso): Como?
VALENTIM: É isso mesmo que ouviu, mas não conte a ninguém. Confiei isso a você, pois é o melhor amigo de Anabel.
LINO: Se dependesse de mim, não seria apenas uma amizade…
VALENTIM: O que quer insinuar com isso?
LINO: Eu vim até aqui para conversar com Anabel, um assunto muito sério para nós dois.
VALENTIM: Para evitar confusões ou coisas do tipo, eu só quero adiantar a você uma coisa: Anabel e eu estamos noivos!
Lino fica sem chão.
LINO (Atônito): O quê?
VALENTIM: Pois é. Eu e ela descobrimos que não somos irmãos, e percebemos que estávamos apaixonados um pelo outro. Nosso casamento será em breve. (Debocha) Sabe, você e Anabel são tão próximos, creio que ela te convidará para padrinho…
Nesse momento, Lino se enche de raiva. Ele fecha sua mão, e dispara um soco no rosto de Valentim. O rapaz cai no chão, com o canto da boca sangrando.
LINO: Eu sempre soube que você não prestava. Olhando agora para você, para esse seu deboche, eu vejo que só escondia sua verdadeira face fingindo ser um bom rapaz.
VALENTIM: Chega! Saia da minha casa! Você entra aqui, desfere um soco em meu rosto, e ainda me acusa dessas asneiras? Vá embora, agora!
LINO: Sua casa? Olha como fala… Nem parece que alguns dias atrás se fingia de moço humilde e bem educado. Eu só quero lhe falar uma última coisa: eu vou acabar com você, vou mostrar a Anabel sua verdadeira face. No primeiro dia que pisou aqui, eu pus um detetive para descobrir o seu passado. Custou-me um bom dinheiro, isso é claro, mas eu faço de tudo para proteger Anabel. Está avisado!
O rapaz se retira pela porta da frente. Valentim põe a mão na boca.
VALENTIM (Irritado): Mercedes! Venha cá!
A governanta chega no local e se assusta com a aparência do rapaz.
MERCEDES: Pois não?
VALENTIM: Não deixe mais esse pobretão entrar nesta casa. E se ele ousar chegar perto de Anabel novamente, me avise!
MERCEDES: Claro!
Elias e Leonel trabalham dentro da mesma sala.
LEONEL: O que aconteceu hoje? Mal saiu da sala, e normalmente fica rondando pelos corredores da fábrica.
ELIAS: Acordei um pouco indisposto hoje. Estou mais para assinar papéis e tomar um café.
Alguém bate na porta, e Vitório a abre.
LEONEL: Oh, Vitório! Entre.
O homem entra na sala.
VITÓRIO: Eu preciso falar com você sobre aquele assunto…
LEONEL: Claro! Elias, você consegue nos deixar a sós por um momento?
ELIAS: Claro!
O rapaz levanta e sai da sala. Vitório senta-se frente a frente com Leonel, com uma mesa entre eles.
VITÓRIO: As notícias que trago são péssimas!
LEONEL: O que o Coronel vai aprontar desta vez?
VITÓRIO: Ele mandou que Jarbas ficasse de guarda na saída da fábrica. Ele mandou que Jarbas matasse você!
Um tremor percorre pelo corpo de Leonel.
LEONEL: Me matar? Isso não faz sentido! Guilhermino quer se vingar de mim, fazendo-me sofrer. Tem certeza disso?
VITÓRIO: Claro, eu ouvi palavra por palavra. Sei que é muito estranho, mas tome cuidado, mesmo assim.
LEONEL: Claro! Acho que já irei para casa agora mesmo. Não posso dar sorte ao azar.
Elias ouvia a conversa atrás da porta. O rapaz fica pensativo, lembrando-se do acordo que fez com Débora.
Lino chega à pensão, tremendo de raiva. Jonas vê que o amigo está em fúria.
JONAS: O que há agora?
LINO: Anabel e Valentim vão se casar… Eu não sei como isso foi acontecer.
JONAS: O quê? Mas eles não são irmãos?
LINO: É uma longa história… Lembra-se daquele detetive que eu lhe falei? Eu preciso que ele me dê algum retorno, logo! Anabel está caindo nas garras daquele salafrário, e eu não posso deixar isso acontecer.
JONAS: Conseguiu falar com ela, pelo menos?
LINO: Ela não estava em casa.
JONAS: Não podemos ficar com essas joias roubadas por tanto tempo. E se a polícia der as caras aqui?
LINO: Isso não irá acontecer! Agora o foco é proteger Anabel dessa cascavel.
Elias e Leonel chegam em casa. Débora lê uma revista, sentada no sofá, de pernas cruzadas.
DÉBORA: Ué, chegaram tão cedo?
LEONEL: Havia pouco trabalho hoje. Vou até o jardim, estou pensando em fazer uma reforma para deixá-lo bonito, como era antigamente, e contratar um jardineiro para cuidá-lo. Acho que foi um erro enorme ter deixado toda essa construção de Celine largada a esmo.
O homem anda na direção do jardim da mansão.
DÉBORA: E então, descobriu alguma coisa?
ELIAS: Leonel foi embora, pois um homem chegou lá e falou para ele que o Coronel pretendia matá-lo.
DÉBORA (Rindo): A ideia do plano falso realmente funcionou! E quem era esse homem?
ELIAS: Eu não o conheço, mas seu nome é Vitório.
DÉBORA: Vitório… Talvez o Coronel saiba quem é.
ELIAS: Agora cumpra sua parte do acordo e me devolva a carta!
DÉBORA: Por enquanto não, queridinho. Preciso saber se essa informação procede. Se o Coronel confirmar que exista alguém com esse nome, eu devolvo. Agora, vou tomar um bom banho e ir até a fazenda.
A mulher sobe as escadas, cantarolando. Elias põe a mão no rosto, tenso.
Leonel observa o jardim, lembrando-se dos momentos que teve ali ao lado de Celine.
LEONEL: Eu vou reconstruir tudo isso! Não era para ter abandonado uma parte tão importante da nossa história, me arrependo de não ter cuidado desse lugar como deveria.
Ele é surpreendido por Elza, que chega no local.
LEONEL: Elza, o que quer?
ELZA: Vim em paz! Na verdade, queria contar algo para você.
LEONEL: Contar-me algo?
ELZA: Sabe, Leonel, eu te contei que reencontrei Lúcia meses depois do nosso desentendimento, não contei?
LEONEL: Claro, disse que ela estava rica, que havia se casado com um homem rico…
ELZA: Isso mesmo! Mas… eu ocultei uma parte dessa história. Ela estava com uma criança nos braços, um filho!
LEONEL: Lúcia teve uma criança? Fico feliz que ela tenha seguido sua vida.
ELZA: Um filho seu, Leonel!
Leonel se espanta.
LEONEL: Eu não entendi o seu joguinho, mas sei que está querendo me enganar.
ELZA: Não, é a mais pura verdade! Lúcia teve um filho seu, e eu sei onde eles estão agora.
LEONEL: Então me conte! É meu direito saber disso!
ELZA (Sorrindo): Essa é a parte divertida da história, eu não contarei!
LEONEL: Está blefando.
ELZA (Sorrindo): Se é o que acha, continue deixando seu filho sem um pai!
LEONEL: Você vem até minha casa, conta-me uma coisa absurda como essa, e ainda se recusa a terminar o que está falando?
ELZA: Exatamente! Eu só quero que tenha em mente que há um primogênito seu espalhado em algum lugar por aí, fruto de uma traição. Talvez você descubra onde ele está, ou morrerá sem nunca conhecê-lo. Bom, era apenas isso que eu tinha para te falar… Adeus!
A mulher vira-se de costas, sorrindo e satisfeita.
LEONEL (Confuso): É um blefe, só pode ser um blefe!
FIM DO CAPÍTULO
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