Débora e Leonel ficam se encarando por um longo período. A mulher está amedrontada, sem saber o que fazer, e o homem, cheio de raiva. Elias, atrás de Leonel, e Gláucia, sentada no sofá, apenas observam a cena.
LEONEL (Bravo): E então, Débora, não vai me responder? O que está fazendo com as joias de Celine?
DÉBORA (Mudando de assunto): Leonel, querido, que bom que está aqui! Eu…
LEONEL (Interrompendo): Acho que eu havia deixado bem claro que essas joias devem ser intocadas, pelo o que eu me lembro.
DÉBORA: E por que eu não posso tê-las? Estão abandonadas naquele quarto desde que Celine morreu. Se quer saber, eu creio que ela adoraria me ver usando e passando adiante as coisas que eram dela.
LEONEL: Se ela quisesse isso, você teria herdado tudo o que era dela. Além de que você herdou uma parte das joias, mais valiosas ainda, pois eram de seus antepassados. Por que não usa elas?
DÉBORA: Porque eu as vendi!
GLÁUCIA (Surpresa): Débora? Aquelas joias eram da família! Você não podia ter feito isso!
DÉBORA: Mas eu fiz. E acho que as outras de Celine também devem ser minhas.
LEONEL: Para quê? Para você vendê-las também? Pois isso não acontecerá! Se quer saber, Débora, eu não confio em você. Nunca que eu largaria coisas tão valiosas, que restaram da memória de Celine, nas suas mãos. E eu espero que você entenda que nada disso…
O homem abre os braços, se referindo à casa e tudo ao seu redor.
LEONEL:... Nada disso será seu um dia. Então engula toda essa sua inveja e todo esse ódio ressentido, e aceite que essa sempre foi e sempre será sua realidade!
Lágrimas de ódio escorrem pelo rosto de Débora.
DÉBORA: Maldita hora que você foi aparecer!
LEONEL: Agora me devolva as joias! Elas não te pertencem.
DÉBORA (Desafiando): Não devolvo! Agora elas são minhas, como, desde sempre, deveriam ter sido.
LEONEL: Pois então eu tiro à força!
Ele parte para cima da mulher, que começa a gritar, a segurando e tentando tirar os itens da posse dela. Elias tenta separá-los e Gláucia apenas observa, chocada.
ELIAS (Separando eles): Leonel! Pare com isso! Está exagerando!
Depois de uma longa briga e gritaria, eles são separados. Débora passa a mão no pescoço e Gláucia vai acudir a sobrinha. Leonel, com as joias em mãos, é segurado por Elias e olha com ódio para a mulher.
LEONEL (Irado): Nunca mais me enfrente dessa forma!
Ele sobe as escadas e Elias vai atrás. Débora cai no chão, sentindo-se humilhada. Gláucia olha com reprovação para ela.
GLÁUCIA: Eu avisei…
DÉBORA (Com ódio): Isso não vai ficar assim! Ele vai me pagar!
Leonel entra em seu quarto e Elias vem logo atrás.
ELIAS: O que foi aquilo? Você surtou!
LEONEL: Há quanto tempo ela está usando as coisas de Celine?
ELIAS: Bem, eu não sei! Eu nunca havia visto.
LEONEL: É por isso que eu não queria voltar para esse lugar, sabia que seria tão estressante! Eu tive uma viagem cansativa, e ainda há esse roubo que está me deixando louco. Afinal de contas, o que aconteceu com você? Tentei te telefonar diversas vezes e nunca estava na empresa.
ELIAS: Ocorreu um problema com…
LEONEL (Interrompendo): Esqueça! Não vamos falar sobre isso agora. Eu só quero descansar, deitar e ter uma boa noite de sono.
ELIAS: Acho melhor mesmo, você está de cabeça quente. Amanhã eu te atualizo sobre tudo, boa noite!
Elias sai e deixa o homem sozinho no seu quarto.
Corta para Anabel e Valentim, que ainda estão na biblioteca.
VALENTIM: É claro que te contei toda a verdade, por que eu mentiria para você?
ANABEL: Motivos para alguém mentir para mim não faltam. Seja sincero comigo, se está escondendo alguma coisa, se você mentiu na nossa primeira conversa e não tem coragem de se desmentir, conte a verdade para mim. Eu sou capaz de perdoá-lo.
VALENTIM: É como eu disse, não contei nenhuma mentira a você, juro que é tudo verdade. Agora, sinto-me chateado com toda essa desconfiança em cima da minha pessoa. Parece que se recusa a acreditar em mim, ou que não me quer como irmão…
ANABEL: É que eu fiquei com uma pulga atrás da orelha depois de uma conversa com Mercedes…
VALENTIM: Como assim?
ANABEL: Ela me disse que eu não deveria ter tanta certeza de que somos irmãos.
VALENTIM: Isso é estranho mesmo… Mas, se não formos irmãos, isso mudaria algo entre nós?
ANABEL: Bem… Nós não seríamos irmãos, né? Acho que isso já é uma grande mudança.
VALENTIM: Se, por acaso, eu estiver enganado sobre tudo que lhe disse, saiba que adoraria manter uma ótima relação com você. É uma ótima pessoa, e eu a admiro muito!
ANABEL: Obrigada, Valentim! Essa insinuação de Mercedes mexeu muito comigo, acho melhor me deitar.
VALENTIM: Espere ao menos pelo jantar. Não deixe de se alimentar…
ANABEL: Estou sem fome, quero apenas botar meus pensamentos no lugar. Boa noite!
Ela se retira, deixando Valentim pensativo.
Leonel entra no quarto de Celine e fecha a porta. Ele põe as joias em seus devidos lugares e, após isso, fica admirando o local com lágrimas nos olhos.
LEONEL: Até hoje me dói muito… muito mesmo… Sinto tanta falta de ti, das nossas conversas, dos nossos passeios pelo jardim. Tudo o que faço é para honrar o que fez por mim. Se não fosse meu amor por você, eu já teria abandonado tudo, e seguido outra vida, mas não consigo ignorar que tudo isso ao meu redor significa a confiança que me deu, e que não posso quebrá-la. Se eu pudesse fazer apenas um desejo, e que ele se realizasse, eu desejaria tê-la de volta em meus braços e uma vida feliz ao seu lado. Mas não há nada que eu possa fazer…
Ele se vira para sair do cômodo. Do lado de fora, ele tranca a porta para que Débora não entre novamente.
O trem para na estação de Riacho das Rosas e Jonas desembarca. O rapaz procura por algum lugar para se hospedar e chega até a pensão Maria das Graças. Ele vai até o balcão onde toca o sininho. Logo depois, Tomé surge para atendê-lo.
TOMÉ: Boa noite! Do que gostaria?
JONAS: Alugar um quarto, se quiser pago adiantado por alguns dias.
TOMÉ: Uns 3 dias de adiantamento já está ótimo.
Jonas entrega o dinheiro.
TOMÉ: Está bem! Aqui está a chave. O rapaz gostaria de jantar? Será servido em instantes.
JONAS: Gostaria sim, só vou deixar minha mala no quarto.
TOMÉ: Ótimo, eu te levo até lá!
Tomé o acompanha subindo as escadas.
Anabel está deitada em sua cama. Ela pensa nos acontecimentos dos últimos dias, confusa e tentando entender cada detalhe.
ANABEL: Não vou conseguir dormir desse jeito. Melhor eu tomar um copo de água.
A moça se levanta e desce as escadas. À medida que ela vai se aproximando da cozinha, ela ouve vozes vindo do local. Ao se aproximar mais, a moça identifica que é uma conversa entre Valentim e Mercedes. Ela se encosta no canto da parede, sem que a vejam, e ouve o que eles estão falando.
VALENTIM: … Você andou falando para ela alguma coisa, tentando botá-la contra mim!
MERCEDES: Ora, mas eu não disse nada que atrapalhasse a relação entre os dois. Muito pelo contrário, eu tentei fortalecer o relacionamento entre vocês.
VALENTIM: Mas ela estranhou algo que você disse, insinuou que não éramos irmãos.
MERCEDES: Exatamente, poderiam se tornar um casal se não fossem irmãos.
VALENTIM: Sei que faz gosto desse relacionamento, mas isso não acontecerá, infelizmente.
MERCEDES: Mas pode acontecer! Eu tenho certeza de que vocês estão livres para assumir esse relacionamento. Pare de tentar ir contra isso e abrace a oportunidade.
VALENTIM: Olha o jeito que fala… Está sabendo de algo que não sabemos. O que você tanto esconde?
MERCEDES: Quem você pensa que é, para ficar me enfrentando dessa forma? Vamos encerrar essa conversa por aqui.
A governanta se retira pela outra saída da cozinha.
VALENTIM: Isso mesmo! Fuja do assunto! Mas eu hei de descobrir o que você está escondendo.
Valentim fica no local, pensativo. Anabel volta para o seu quarto antes que o rapaz a veja.
O pessoal da pensão está jantando. Lino senta na mesma mesa de Jonas.
LINO: Hóspede novo?
JONAS: Sim, cheguei agora a pouco.
LINO: Prazer, Lino! Sou o filho do dono.
JONAS: Prazer, Jonas!
LINO: Está a procura de que nesta cidade?
JONAS: Bom, não sei se devo dizer…
LINO: O que há de tão secreto nisso?
JONAS: Olha, fica entre nós isso que eu vou contar. Eu estou atrás da família de Bernardino Ferreira.
LINO: Bernardino Ferreira?
JONAS: Sei que ele já morreu, mas você conhece algum parente?
LINO: Claro que conheço. Conheço muito bem, afinal.
JONAS: Você consegue me levar até eles? É um assunto que deve interessar muito a eles.
LINO: Você poderia me dizer do que se trata? Eu sou um grande amigo da filha dele, estou muito disposto a ajudar seja lá no que for.
JONAS: Eu vou te contar a história, desde o início…
Jonas continua falando, contando tudo a Lino, que por sua vez fica mais surpreso a cada palavra do rapaz.
Um novo dia amanhece. Guilhermino toma seu café da manhã, sozinho, até que recebe Jarbas. Logo atrás do capataz, Vitório se aproxima, se escondendo para que ninguém o veja.
GUILHERMINO: O que quer?
JARBAS (Sorrindo): Trago uma notícia que vai agradá-lo muito.
GUILHERMINO: E do que se trata?
JARBAS: Ele está de volta. Depois de 17 anos, retornou à cidade.
Guilhermino dá um sorriso maldoso.
GUILHERMINO: Finalmente vou me vingar desse homem, ele não sabe com quem mexeu…
Vitório, que dessa vez foi mais cuidadoso, ouve a conversa com medo em seu olhar.
Leonel chega na fábrica acompanhado de Elias. Os dois seguem até a sala explodida, onde o homem examina a situação.
LEONEL: Quanta destruição… Havia muita coisa em jogo nesse cofre.
ELIAS: Me desculpe pela pergunta, mas por que você guardou coisas tão importantes… aqui?
LEONEL: Sei que a segurança é pouca, mas achei que ninguém procuraria por algo logo aqui. Poucas pessoas deveriam ter conhecimento deste cofre, na verdade. Por isso suspeito que tenha sido alguém daqui de dentro.
ELIAS: Acho provável…
LEONEL: E onde está aquele outro rapaz que o acompanha aqui?
ELIAS: O Jonas teve que se ausentar por um tempo, por problemas familiares. Mas pode deixar que eu seguro tudo por aqui. E não bote suspeitas em cima dele, estava comigo na hora do ocorrido, é inocente!
LEONEL: Assim espero. Agora é esperar que descubram quem fez isso.
Anabel está na sala, pensativa. Valentim se aproxima da moça.
VALENTIM: Dormiu bem?
ANABEL: Dormi.
Ela se cala, sem puxar assunto.
VALENTIM: Está tudo bem? Você está um pouco estranha…
ANABEL: Tudo bem, sim. Eu só acordei com um pouco de dor de cabeça.
A campainha da mansão toca e Anabel vai atender, revelando Lino e Jonas do outro lado da porta.
LINO: Bom dia, Anabel! Podemos entrar?
ANABEL: Claro! Bom dia! (Para Jonas) Muito prazer!
JONAS: Prazer!
Os dois entram. Mercedes aparece na sala.
MERCEDES: Foi a senhorita que atendeu? Isso não é…
ANABEL (Interrompendo): Você não estava aqui e eu abri. Dá um descanso, Mercedes! Eu consigo abrir a porta muito bem.
Mercedes se assusta com a grosseria.
ANABEL: Bom, meninos, aceitam alguma coisa?
LINO: Eu não.
JONAS: Também não quero nada.
LINO: Anabel, a gente veio até aqui falar sobre uma coisa muito séria. Este é Jonas, ele veio de Vila das Camélias, acabou de perder o pai.
ANABEL: Sinto muito!
JONAS: Obrigado! A questão é que antes de meu pai morrer ele me disse coisas muito difíceis, e que envolvem a sua pessoa…
ANABEL: Como assim?
LINO: Anabel, naquela noite, na saída do teatro, quando seus pais morreram, não foi um assalto, mas sim uma morte comprada.
Todos no local se chocam com a revelação.
Tião está pondo alguns sacos em cima da carroça. Flor passa por ali, olhando para o homem.
FLOR: Tá forte, hein Tião.
TIÃO: Oh, Florzinha! Vai ficar só aí, me olhando, ou quer chegar mais pertinho?
FLOR: Abusado! Vou indo, pois Elza está me esperando.
Ela sai andando e o homem só observa. Vitório passa pela moça correndo e vai até Tião.
VITÓRIO: Já está saindo?
TIÃO: Só falta mais esse.
VITÓRIO: Vou junto com você.
Vitório vai subindo na carroça enquanto Tião carrega o último saco.
TIÃO: Ué, por quê?
VITÓRIO: Te explico no caminho.
Tião sobe na carroça e os dois dão partida.
Jonas termina de explicar toda sua história novamente.
ANABEL: Meu Deus! Não sei nem o que dizer…
VALENTIM: Então, foi um assassinato…
JONAS: É. Só soube disso recentemente, e o culpado da morte do pai de vocês também matou o meu. Eu quero fazer justiça!
ANABEL: Você tem todo nosso apoio, Jonas, obrigada por nos procurar!
VALENTIM: E por onde podemos começar?
ANABEL: Por enquanto, vamos botar todas as pistas em ordem. Depois pensamos no que fazemos.
LINO: Anabel, podemos conversar por um momento? Sozinhos?
ANABEL: Claro! Fique à vontade, Jonas! Já voltamos!
Anabel e Lino saem, deixando o restante do pessoal.
Eles caminham no lugar de sempre, perto do penhasco.
LINO: Percebi que você estava um pouco distante…
ANABEL: Andaram acontecendo algumas coisas que me deixaram ouriçada…
LINO: Não gostaria de compartilhar comigo? Acho que eu poderia ajudá-la, e seria melhor do que guardar para si.
ANABEL: Eu realmente posso confiar em você. Mercedes me disse uma coisa que está me deixando louca, e eu estou desconfiada de Valentim.
LINO: Explique melhor!
ANABEL: Mercedes insinuou que eu e Valentim não somos irmãos. Foi de uma forma muito estranha, como se ela estivesse escondendo algo.
LINO: Mas por que ela nunca havia falado sobre isso antes?
ANABEL: Eu também não sei. Ontem à noite, eu ouvi uma conversa estranha entre os dois. Eu havia conversado com Valentim sobre esse mesmo assunto, e, logo depois, encontrei ele enfrentando Mercedes.
LINO: Então acha que ele está te enganando?
ANABEL: Eu não sei… Mesmo com aquela afronta, Mercedes não apontou o dedo para ele em momento algum, muito pelo contrário, jogou ele para cima de mim e vice versa. Por isso, eu penso que se ele fosse um farsante, ela estaria contra Valentim. Mercedes sempre teve seus defeitos e mistérios, mas sempre quis o meu bem.
LINO: Logo a verdade aparecerá. Há muitas pontas soltas sendo deixadas nessa história. E quanto mais furos, mais fácil de descobrir.
ANABEL: Assim eu espero… Obrigada por estar sempre ao meu lado! Você é muito importante para mim.
LINO: Amigos são para isso!
Os dois se abraçam. Ela se sente protegida em seus braços, enquanto ele se encanta pelo cheiro perfumado da moça, ambos desejando que aquele momento nunca acabasse. Após algum tempo, eles se separam.
ANABEL: Vamos voltar. Agora há essa história tão absurda quanto essa que eu estou tentando entender.
LINO: Vamos conseguir resolver tudo isso, é só uma questão de tempo.
Os dois andam de volta na direção da mansão.
No casarão da fazenda, Guilhermino está sentado à mesa, esperando pelo almoço. Elza adentra o local.
ELZA: O que quer? Pediu que me chamasse?
GUILHERMINO: Sim, sente-se que a conversa promete ser longa.
A mulher senta em uma das cadeiras.
ELZA: Então?
GUILHERMINO: Se quer se vingar, decida-se agora, pois o homem está de volta à cidade.
ELZA: Leonel voltou?
GUILHERMINO: Sim. E então, vai querer agir, ou continuar com essa ideia de boa moça?
Elza se vê em dúvida, relembrando o seu passado e tudo o que viveu.
FIM DO CAPÍTULO
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