CENA 01 - SILO DE GRÃOS - GALPÃO - CONTINUAÇÃO
Graça sente seu estômago embrulhar. Ela começa a ter ânsia de vômito, e coloca a mão na barriga. Ela olha pro pen drive caído no chão e pega ele. Ela corre, fecha o galpão, e entra no carro.
(Heart-Shaped Box - Nirvana)
Ela dirige com rapidez pela estrada, ultrapassando os carros. Sua expressão é de medo e nervosismo.
Ela começa a ter uns flashes de memória dela batendo com a barra na cabeça de Lúcia, quando de repente, ela quase bate o carro.
Corta para:
CENA 02 - MANSÃO LA SELVA - SALA DE ESTAR - INT/NOITE
Irene está sozinha, pensativa, com um olhar perdido, fumando um cigarro. Ela passa a mão pela testa, como se estivesse tentando pensar em alguma coisa. Ela tragava cada momento daquele cigarro como se fosse a última vez que ia fazer aquilo.
De repente, Antônio surge silenciosamente. Ele se senta ao lado dela.
Antônio - O que aconteceu com você? Desde cedo assim…
Irene dá uma tragada longa no cigarro, sem olhar pra ele.
Irene(soltando fumaça) - Não aconteceu nada. Só… me deixa um pouco em paz.
Antônio - Já te falei pra parar com esse cigarro. Isso só te faz mal, Irene.
Irene(olha pra ele, fria) - Eu não me importo. Eu vou continuar fumando, sim. Me alivia.
Antônio - Você tem certeza que não aconteceu nada? Se você estiver assim por causa daquela Aline… fica tranquila que eu já estou tomando as minhas providências.
Irene(irritada, levantando-se) - Mas que inferno! Me deixa fumar em paz, pelo amor de Deus!
Ela apaga o cigarro no cinzeiro e entra pela casa.
Um silêncio permanece por alguns segundos. Vinícius aparece, vindo de dentro, com uma expressão confusa.
Vinícius - O que foi isso? O que deu nela?
Antônio apenas dá um gesto vago com as mãos, como quem diz: “sei lá”.
CENA 03 - MANSÃO LA SELVA - QUARTO DE ANGELINA - INT/NOITE
Angelina está de costas, observando as estrelas na janela em silêncio. De repente, a maçaneta gira lentamente. A porta range baixinho. Irene entra sorrateiramente. Seus olhos brilham de ódio. Ela encara Angelina, cheia de raiva.
Angelina percebe a presença de Irene e se vira.
Angelina - Ah, dona Irene. É a senhora? Engraçado… eu tava aqui pensando nas cuecas do Ramiro.
Irene franze a testa. Angelina continua, inocente.
Angelina - Quer dizer, quando eu lavo… tem um cheiro, sabe? Não sei se são os hormônios, se é testosterona de caminhoneiro embalada a vácuo. Mas aquilo me dá um… tremor. Aquele cheiro de homem suado. Uma coisa assim… espiritual.
Angelina sorri pra si mesma.
Irene - Cala a boca, sua idiota.
Angelina(arregalando os olhos) - Que isso, dona Irene? O que aconteceu?
Irene - Eu quero preste bastante atenção no que eu vou te perguntar. O que você foi fazer durante os dias que esteve fora? Na mesma semana que a Petra teve aquele surto aqui em casa.
Angelina - Eu? Bom… eu fui visitar uma tia minha que estava muito doente, sabe? O negócio tava feio pro lado dela, coitada.
Irene(interrompendo, feroz) - Mentira! E por acaso o nome da sua tia é Agatha? E você trouxe ela pra Nova Primavera?
Angelina - Eu não sei do que você tá falando…
Irene - Para de ser sonsa! Você foi buscar a vadia no Rio de Janeiro. Você foi atrás dela, está de conluio.
Angelina - Eu realmente não sei do que a senhora está falando.
Irene - Acho melhor você confessar, senão vai ser pior pra você.
Angelina, vencida, abaixa os olhos.
Angelina - Quer saber a verdade? Pois bem. Eu fui sim. E quer saber mais? Ela vai acabar com o teu império, Irene. Espera só o Antônio descobrir que a Agatha tá viva… Ele vai te chutar da vida dele feito tampa de bueiro em enchente!
A expressão de Irene se distorce num misto de raiva e descontrole. Ela levanta a mão e dá um tapa forte no rosto de Angelina. O anel em seu dedo deixa um corte visível.
Angelina(grita, leva a mão ao rosto) - Meu Deus! O que você fez?!
Irene(fora de si) - Isso é só o começo, vagabunda! Enquanto você morar nessa casa, eu vou destruir sua vida. Vou transformar a sua existência num purgatório, ouviu bem? Um purgatório!
Angelina cai sentada na beira da cama, chorando de dor e medo.
Angelina - Eu não mereço isso…
Irene(saindo) - Merece sim! Isso é pra você aprender a não se meter com pessoas acima de você!
Irene bate a porta ao sair, deixando Angelina sozinha, machucada, humilhada.
CENA 04 - PENSÃO DA LUCINDA - FRENTE - EXT/NOITE
Silêncio na rua. O farol de um carro ilumina discretamente a fachada antiga da pensão. Gregório desliga o carro, com um olhar ansioso.
Quarto de Pérola:
Pérola observa pela janela entreaberta. Seus olhos brilham de expectativa e um certo nervosismo.
Ela desce as escadas em silêncio absoluto, passando pelas portas fechadas. Lucinda dorme. Ninguém a vê. Ela sai pela porta da frente.
Carro de Gregório:
Ela entra. Gregório sorri, charmoso. Pérola aperta o cinto.
Pérola(sussurrando) - É normal fazer teste assim… nesse horário?
Gregório - Na nossa produtora ninguém dorme. É 24 horas resolvendo coisas. O cinema, Pérola… o cinema não espera.
Ela sorri, encantada. Ele dá partida.
(Nuvem de Lágrimas - Fafá de Belém)
CENA 05 - CIDADE VIZINHA - CABANA - INT/NOITE
A casa é simples, mas está equipada com alguns refletores, câmeras, cadeiras. Tudo parece improvisado, mas profissional. Pérola entra devagar, observando o ambiente.
Pérola(cautelosa) - Ué? Cadê o pessoal?
Gregório(ajeitando a câmera) - Esse teste é só entre nós dois. Mais intimista. Quero captar algo cru, verdadeiro. Algo nu! Confia em mim.
Ela assente, ainda tímida. Ele posiciona a câmera, acende uma luz direta no rosto dela.
Gregório - Tá preparada? Quero que você finja… que acabou de matar alguém. Mostra o desespero, mas sem gritar. Só com o olhar.
Pérola respira fundo. Fecha os olhos e começa.
Pérola(em cena) - Eu… eu não quis fazer isso. Meu Deus, o que foi que eu fiz?
Ela chora de leve. Gregório observa, mas seu olhar é cínico, quase entediado. Quando ela termina, ele desliga a câmera.
Gregório(mentindo) - Uau… Pérola, foi maravilhoso. Você tem algo… bruto. É isso que a gente procura.
Ela sorri, aliviada.
Pérola - E agora? A gente continua?
Gregório - Não hoje. Outras pessoas precisam ver seu teste.
Ela assente compreensiva. Gregório dá um passo à frente.
Gregório - Vou ser sincero. Você tem uma beleza tão única. Um magnetismo.
Pérola abaixa o olhar, tímida.
Pérola - Eu… não sei se posso fazer isso.
Gregório - Você namora?
Pérola - Não.
Gregório - Então qual o problema?
Ela não responde. Ele toca de leve o cabelo dela, ajeita uma mecha atrás da orelha. Ela fecha os olhos, respira rápido.
Gregório - Tá tudo bem. Eu vou ser respeitoso.
Ele se aproxima mais. Ela hesita, mas acaba cedendo. Eles se beijam. Eles acabam tirando as roupas e caminhando, se beijando, até o quarto. Eles entram e fecham a porta.
Corta para:
(Nuvem de Lágrimas - Fafá de Belém)
Cenas do sol amanhecendo em Nova Primavera.
CENA 06 - CASA DE FERNANDA - SALA- INT/MANHÃ
A casa é simples e aconchegante. Fernanda caminha de um lado para o outro, com o celular na mão. Ela está com os olhos inchados, preocupada.
Fernanda(nervosa) - Ela não atende desde ontem à noite, Kairon. Isso não é normal. A Lúcia sempre manda mensagem, sempre avisa…
Kairon, sentado no sofá, tenta parecer calmo.
Kairon - Calma amor. Vai ver ela foi pra alguma festa, ficou sem sinal, dormiu fora… Você sabe como a Lúcia é. Daqui a pouco ela aparece com alguma história maluca.
Fernanda para, respira fundo. Tenta concordar.
Fernanda(tentando se convencer) - É… pode ser… Mas se alguma coisa tiver acontecido com ela, eu vou atrás da tal Graça.
Kairo levanta e abraça ela por trás.
Kairon - Por que você tá dizendo isso?
Fernanda - Por nada…
Corta para;
CENA 07 - MANSÃO LA SELVA - QUARTO DE GRAÇA E CAIO - INT/MANHÃ
O quarto está escuro, cortinas semiabertas. Graça se senta na beirada da cama, ofegante, suada, em camisola. Ela levanta com esforço e caminha até o banheiro.
Ela se encara no espelho, seus olhos estão fundos. Ela abre a torneira e joga água no rosto. Ela se lembra da noite anterior, dela matando Lúcia soterrada no silo. Ela grita, se apoiando na pia. Os olhos enchem de lágrimas.
CENA 08 - MANSÃO LA SELVA - MESA DE CAFÉ - INT/MANHÃ
Antônio toma seu café tranquilamente, lendo o jornal. Caio, do outro lado da mesa, mexe no celular. O clima é calmo, cotidiano.
De repente, Petra surge.
Antônio - Ué, Petra? O que faz acordada tão cedo?
Petra(sorrindo) - Decidi ir pra cooperativa de novo. Gostei de lá. É interessante… E conheci uma moça super legal, a Clara. A gente já virou amiga.
Antônio esboça um sorriso satisfeito.
Antônio - Que bom, filha. Fico feliz que esteja se interessando pelos negócios da família.
Antes que ela responda, Vinícius aparece atrás dela.
Vinícius - Bom dia, meu povo!
Petra se assusta. Ela corre pro outro lado da mesa.
Vinícius - Que foi, minha sobrinha? Se assustou com o titio?
Petra(nervosa) - Vamos logo, gente.
Antônio e Caio trocam olhares.
Caio(levantando) - Eu passo lá depois. Tenho uma coisa pra resolver antes.
Vinícius - Ah, que bonito. Todo mundo me abandona e eu tomo café sozinho.
Antônio(rindo) - Chama a Angelina.
Todos saem pela porta.
Corta para:
CENA 09 - GALPÕES DA EMPRESA DE ALINE - INT/MANHÃ
O lugar ainda tem um movimento leve de pessoas. Caio está encostado no próprio carro, óculos escuros, braços cruzados. Ao fundo, o carro de Aline se aproxima e estaciona.
Aline desce com elegância. Fecha a porta com calma e ergue os olhos. Ela vê Caio.
Caio tira os óculos escuros devagar. O olhar é direto.
Aline encara de volta.
O instrumental cresce.
ENCERRAMENTO.
(Lost On You - LP)
Nenhum comentário:
Postar um comentário