É fim de tarde. Anabel anda pelo jardim da Mansão Sanchez, observando as poucas plantas e flores vivas. Leonel se aproxima da moça.
LEONEL: Está melhor? Saiu muito chateada lá da fazenda
ANABEL: Estou sim. Só vim espairecer um pouco aqui. Jardim bonito, por sinal!
LEONEL: Hoje em dia, está acabado. Tinha que ver quando Celine ainda estava aqui. Era o jardim mais bonito que já vi, belo e cheio de vida.
ANABEL: Celine… Fala dela com um brilho nos olhos. Creio que tenha sido uma pessoa muito importante para você.
LEONEL: Ela era muito especial. Todos os dias, nós dois andávamos por esse jardim, conversando sobre tudo e nada ao mesmo tempo, era um momento apenas nosso.
ANABEL: Como foi a sensação de quando ela se foi?
LEONEL: Eu fiquei sem rumo… Minha vontade era sumir desse mundo, desaparecer e tentar esquecer tudo isso, mas eu sabia que não conseguiria. Com o tempo, essa ferida foi se fechando, mas nunca mais foi, e nem será, a mesma coisa.
ANABEL: Só o tempo mesmo para curar uma dor como essa.
LEONEL: E você? Tem alguém especial na sua vida também?
ANABEL: Sim, talvez… Quer dizer, eu não sei direito. Minha vida está uma bagunça, tanto que eu nem consigo me concentrar nesse tipo de coisa.
LEONEL: Está confusa com seus sentimentos?
ANABEL: Acho que sim…
LEONEL: Olhe, não pense muito, apenas siga o seu coração. Às vezes, ficamos tão presos a pensamentos, que acabamos perdendo um tempo precioso. Precisamos agir também, e não ficar apenas esperando que aconteça algum milagre, ou que nossos desejos se realizem de uma hora para a outra.
ANABEL: Obrigada pelo conselho, Leonel! Amanhã pela manhã, já estarei indo embora, mas saiba que adorei as conversas nesse pouco tempo.
LEONEL: É uma boa moça, Anabel! Passe-me o número de telefone da sua casa, quero manter contato com você.
ANABEL: Claro! Vá me visitar algum dia também, adoraria recebê-lo.
LEONEL: Com certeza irei!
Logo se torna noite, e depois um novo dia amanhece. Leonel acompanha Anabel e Valentim até a estação de trem. Ele se despede do rapaz com um aperto de mãos, e a moça, com um abraço.
LEONEL: Espero que não demore muito para nos vermos novamente.
ANABEL: Sinto que não vai demorar tanto para nos encontrarmos de novo. Tenho a sensação de que nos veremos muitas vezes ainda.
Anabel sorri e, logo depois, sobe no trem. Ela olha para o homem pela janela, enquanto a locomotiva começa a partir.
LEONEL: Que menina engraçada. E eu ainda tenho aquela sensação de que ela me lembra alguém…
O homem continua olhando, e a locomotiva some no horizonte.
Débora está tomando o café da manhã, acompanhada de Elias, que lê um jornal enquanto come.
DÉBORA: Elias, primo querido! Responda-me uma pergunta: Leonel anda tendo muitas visitas ultimamente no escritório?
ELIAS: Ele é o dono da empresa, o que você acha? Lógico que ele recebe várias visitas de investidores, fornecedores e etc.
DÉBORA: Mas ele anda recebendo alguma outra pessoa, que não esteja envolvida nesses negócios?
ELIAS: Por que você quer saber, Débora? É a secretária dele por acaso? Pois pra querer saber tanto assim da agenda dele…
DÉBORA: Credo, quanta agressividade! Só estou curiosa, Leonel é sempre tão sozinho. Não é possível que ele não receba algum amigo ou coisa do tipo.
ELIAS: Hum. Sim, ele recebe alguns amigos de vez em quando, mas estão mais para conhecidos do que amigos mesmo.
DÉBORA: Ah é? E quem são?
ELIAS: Essa parte já não é da sua conta mesmo. Vou terminar de me arrumar, pois, quando Leonel chegar, nós iremos para a fábrica.
O rapaz se retira.
DÉBORA: Leonel não recebe ninguém em casa. Essa pessoa que anda passando informações a ele só deve ser recebida lá. E eu vou fazer você dizer quem é, Elias.
Valentim e Anabel estão sentados lado a lado no trem. A moça olha pela janela, pensativa.
VALENTIM: Você ainda não me contou o porquê de sair tão estranha da fazenda naquele dia…
ANABEL: Eu… não quero falar sobre isso.
VALENTIM: Está tão distante, sabe que pode confiar em mim para contar qualquer coisa.
ANABEL: Eu realmente só preciso de um tempo meu.
Eles ficam em silêncio por um tempo.
VALENTIM: Ainda nesta semana é seu aniversário, vai comemorar de alguma forma?
ANABEL: Nem me lembrava mais, esses últimos dias foram tão corridos. Talvez eu faça um jantar apenas para os mais próximos.
VALENTIM: Só acho que não deve passar em branco. Afinal, fará a idade suficiente para assumir o legado do nosso pai.
Ao ouvir aquela lembrança, Anabel tem flashbacks de quando Elza lhe contou sobre a história de traição.
ANABEL: Não acho que seja certo eu assumir tudo…
VALENTIM: E por que não? Você é a herdeira.
ANABEL: Mas você é mais velho, você que deveria comandar, é o seu direito. Por que nunca fez questão de querer o que é seu por direito? Veio até aqui atrás do seu pai, mas nem fez questão de receber o que procurava.
VALENTIM: Não queria te importunar com pedidos. Eu contei a minha história, e deixei em suas mãos a decisão do que fazer.
ANABEL: Por que está sempre deixando tudo em minhas mãos? Nunca toma partido para nada, está sempre vendo o que quero antes de fazer qualquer coisa. Eu não entendo isso…
VALENTIM: Eu tenho medo de tomar alguma decisão que você não goste, ou fazer alguma coisa que não goste. Não quero te deixar magoada ou irritada, porque eu gosto muito de você.
ANABEL: Acho tudo isso uma besteira. É normal as pessoas discordarem de algo, ou discutirem. Não é por esses motivos que eu vou deixar de gostar de você, ou alguma coisa do tipo. Espero que entenda isso.
VALENTIM: Eu entendo…
Débora anda pela mansão, verificando se está sozinha em casa. Após se certificar, ela sobe as escadas e vai até o quarto de Elias. Ela entra no local, e começa a revirar o quarto.
DÉBORA: Ele tem que guardar alguma coisa comprometedora. Por favor, qualquer coisa que o deixe em minhas mãos.
Ela continua vasculhando por um longo período, até que acha um envelope escondido por debaixo das roupas no armário. Uma carta. Ela lê uma mensagem escrita do lado de fora do envelope.
DÉBORA (Lendo): Para Jonas, do fundo do meu coração…
Ela abre o envelope e começa a ler a carta.
Algumas horas se passam. Anabel e Valentim finalmente chegam em casa, recebidos por Mercedes.
MERCEDES: Como foi a viagem?
ANABEL: Cansativa! Mercedes, por favor, anote este número de telefone no caderno. Identifique como sendo a casa de Leonel.
MERCEDES: Claro, senhorita! Mais alguma coisa?
ANABEL: Talvez teremos uma conversa séria mais tarde. Agora, vou até a pensão resolver um assunto.
Jonas cuida da recepção quando vê Tomé descendo as escadas, sozinho.
JONAS: O que o senhor está fazendo em pé? Volte já para a cama!
TOMÉ: Não estou inválido, na verdade, já estou recuperado.
Diz ele enquanto geme de dor a cada passo que dá. Anabel entra no local, surpreendendo-os.
ANABEL: Parece que o senhor já está bem melhor.
TOMÉ: Oh minha querida! Que bom que voltou rápido, Lino já estava todo cabisbaixo, andando pelos cantos.
ANABEL: A culpa é minha, sequer conversei com ele antes de ir. O Doutor Gustavo está?
JONAS: Ainda não, mas já já ele chega.
ANABEL: E onde está Lino?
JONAS: Na cozinha.
ANABEL: Vou até lá.
Lino está cozinhando alguma coisa nas panelas. Anabel entra no cômodo.
LINO (Alegre): Anabel! Que bom que chegou!
Ele corre para abraçá-la. Os dois ficam um tempo juntinhos e depois se separam.
ANABEL: Desculpa por não ter te falado nada antes, mas eu estava muito confusa com toda essa história e não pensei direito.
LINO: Tudo bem! No início eu fiquei um pouco chateado, mas vi que isso era muito mais sobre você do que sobre nós dois.
ANABEL: Nós dois?
Eles são interrompidos por Jonas.
JONAS: Anabel, o Doutor Gustavo chegou.
ANABEL: Avise que estou indo.
Jonas sai, deixando os dois a sós novamente.
ANABEL: Eu vou indo, foi muito bom te ver!
Ela sai, deixando o rapaz sozinho.
Doutor Gustavo e Anabel estão em seu quarto.
GUSTAVO: E então, como foi lá?
ANABEL: Tudo certo, seu amigo é uma ótima pessoa, adorei conversar com ele.
GUSTAVO: Que bom! Achou o Coronel? Conseguiu descobrir alguma coisa?
ANABEL Achei. Inclusive, encontrei Elza pelo caminho…
GUSTAVO (Surpreso): Elza? Como ela está?
ANABEL: Muito bem, casou-se com o Coronel e é professora na escola da fazenda.
GUSTAVO: Fico feliz que ela tenha se encontrado.
ANABEL: Ela não parecia muito feliz não. Focando no assunto, Elza me contou uma coisa e eu quero ouvir apenas a verdade de você.
GUSTAVO: Sobre o que é?
ANABEL: Ela me disse que… que eu não sou filha do meu pai. Não sou filha do Bernardino. E ela disse que foi você quem contou isso a ela. Então me responda: essa história é verdade ou mentira?
Elias e Leonel chegam em casa após um longo dia de trabalho.
ELIAS: Vou subir, quero pegar uma roupa para me banhar.
LEONEL: Está bem! Que estranho, parece não ter ninguém em casa.
ELIAS: Minha mãe foi resolver algo no banco. Quanto a Débora, não sei.
O rapaz sobe as escadas e vai em direção ao seu quarto. Ao entrar no local, ele se depara com Débora, sentada na poltrona ao lado da cama, com a carta em mãos.
DÉBORA: Olá, priminho! Estava andando por aqui e, sem querer, acabei achando essa linda carta de amor. Adoro livros de romance, mas essa trama aqui consegue se superar. (Lendo) “Quero viver junto com você, num lugar onde ninguém pode impedir nossa felicidade”. Achei fofo, não vou mentir, mas o que me surpreende é isso estar se direcionando a outro homem. Priminho? Isso é pecado, viu?
ELIAS (Nervoso): Pare com isso, Débora! Me devolva essa carta agora!
DÉBORA: Talvez eu te dê a chance de devolver essa carta e não falar a ninguém para isso, mas você terá que fazer uma coisa por mim…
ELIAS: O que quer? Eu posso fazer, mas, por favor, não conte a ninguém sobre isso.
DÉBORA: O que eu quero é muito simples, quero que você fique de olho no Leonel para mim, e me diga o nome de cada pessoa que conversar com ele.
ELIAS: Eu sei que você está planejando algo sujo em cima disso, e eu não vou trair a confiança de Leonel.
DÉBORA: Então, sinto muito, pois todos saberão que você é um invertido!
Débora se levanta para sair, mas Elias a para.
ELIAS: Está bem, farei o que está pedindo, desde que cumpra com sua parte do acordo.
DÉBORA (Sorrindo): Dou a minha palavra! Sabe, eu nem tenho preconceito contra essa doença que você tem, mas tem interesses meus envolvidos. Essa cartinha fica comigo por enquanto.
A mulher se retira do local, desfilando. Elias soca a parede, furioso com o que acaba de acontecer.
Continuação do diálogo entre Anabel e Gustavo.
GUSTAVO: Isso… Isso é… É verdade, Anabel! O que Elza disse é a mais pura verdade.
Lágrimas escorrem pelo rosto da moça.
ANABEL (Chorando): Por que escondeu isso de mim? Era meu direito saber!
GUSTAVO: Me perdoe, mas eu não podia simplesmente chegar até você e contar isso. É um assunto difícil, delicado. Você cresceu a vida inteira acreditando em algo que não é verdade, eu sei disso, mas isso impacta muito na sua vida.
ANABEL: Eu preciso de um tempo para mim.
A moça se levanta e sai correndo do local, chorando. Ela passa rapidamente pela recepção, sem ao menos dar tchau aos presentes, que se preocupam com o estado da moça.
Anabel chega aos prantos em casa. Ela sobe as escadas correndo e vai até seu quarto. Valentim, preocupado, vai atrás dela.
VALENTIM: Anabel? Ei, Anabel, o que aconteceu?
Ela se joga na cama, com a mão nos olhos. Valentim senta ao seu lado, tentando acalmá-la.
VALENTIM: Ei! Fale para mim, o que aconteceu?
ANABEL (Chorando): Eu quero ficar sozinha.
VALENTIM: Não, nada disso, conte a mim o que aconteceu. Você sabe que pode confiar em mim. Seja o que for, eu estou aqui, do seu lado.
Ela fica sentada na cama, tentando se recompor.
ANABEL (Embargada): Minha vida toda foi uma mentira. Mercedes estava certa, Valentim, nós não somos irmãos. Eu não sou filha do meu pai…
Ele a abraça, dando-lhe conforto.
VALENTIM: Eu sinto muito! Eu não sei nem o que dizer…
Ela limpa a lágrima dos olhos.
ANABEL: Eu não sei o que fazer agora. No final das contas, você é o dono de toda a herança… Você quem deveria estar no meu lugar.
VALENTIM: Não, nada disso! Isso tudo continuará sendo seu! Eu garanto a você.
ANABEL: Eu não deveria ter nenhum direito sobre isso. Eu não sou filha do Bernardino, eu não deveria ter direito ao seu legado.
VALENTIM: Mas você ainda pode ter… Se quer saber, Anabel, eu nunca a vi como uma irmã. Sempre tive uma atração por você, um forte desejo de amá-la. Eu sempre me senti horrível por ter esse sentimento pela minha própria irmã, mas, agora, vejo que não era por acaso. Eu te amo, Anabel, e quero que se case comigo.
FIM DO CAPÍTULO
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